Eles não precisam de mais uma ameaça!
Como fotógrafo de natureza e conservação, meu objetivo com as imagens que faço é de que elas tenham um efeito positivo. De preferência fomentando a empatia para com a natureza.
Partindo do pressuposto de que fotógrafos focados na conservação como eu, produzem e divulgam suas fotografias para tentar proteger a biodiversidade pela qual somos tão apaixonados, por vezes somos frustrados pelo fato de que apesar de belas, muitas delas não conseguem o apelo necessário ou causar um impacto que gostaríamos que tivessem. Porém algumas fotos acabam nos surpreendendo, atingindo um grande número de pessoas, assim, cumprindo o papel para o qual elas foram criadas.
Apesar de sempre preferir registrar a beleza do mundo natural, muitas das fotografias que fiz e que atingiram esse patamar são de tragédias. Assuntos tristes nos quais normalmente as fotografias mostram explicitamente esses temas ruins, como o que aconteceu com o Rio Doce, mostrando os peixes mortos ou, como em outro exemplo, o atropelamento de animais silvestres, com fotos de vidas perdidas nas rodovias.
Entretanto, em alguns casos, existem fotografias belas, que são utilizadas para defender causas nobres. Um exemplo disso foi a cena que captei, mostrando um grupo de bugios (Alouatta guariba) em Pedra Azul no Espírito Santo. Havíamos iniciado o percurso de estrada de chão voltando da casa de um amigo, logo após o nascer do sol. Era uma manhã fria com a neblina característica da região nessa hora do dia. Como sempre faço, prestava atenção nas árvores abaixo dos barrancos pelos quais passávamos, em busca de vida selvagens. Uma mania que adquiri nas milhares de horas em campo em busca dos assuntos para fotografar. Passando por uma alta Embaúba (árvore bem característica da Mata Atlântica), percebi alguma coisa diferente. Com o carro em movimento, as pequenas "bolinhas" peludas de cor marrom, no vão principal da Embaúba, me chamaram a atenção. Se tratava de uma família de macacos bugio , também chamados de barbados.
Quando parei para fotografar a cena, um desses macacos, que estavam dormindo todos encolhidos e juntos pra se proteger do frio, levantou a cabeça me direcionou um olhar bem profundo. Aquele olhar me comoveu. Na hora, senti que aquela foto um dia serviria para uma causa maior. Fui para casa editei a foto e guardei para utilizá-la no momento certo.
Com as histórias veiculadas pela mídia sobre a tragédia da morte de centenas de macacos devido ao surto de Febre Amarela e o drama da vacinação da população, para piorar a história um novo cenário se formou, no qual, pessoas com pouco acesso à informação e com medo da doença, começaram a matar primatas indiscriminadamente, deixando as populações desses animais ainda mais vulneráveis.
Foi nesse contexto que tive contato com as ações dos amigos pesquisadores do “Projeto Muriqui - ES” divulgando informações sobre o caso e fazendo campanhas sobre os macacos não serem culpados pela transmissão da doença. Então, através do Instituto Últimos refúgios resolvi ajudar a alertar as pessoas sobre o fato de que os macacos não transmitem a doença.
Os macacos contraem o vírus dos mosquitos, assim como os humanos. Para os macacos terem a doença os mosquito já tem que estar contaminados para transmitirem. Levando a conclusão de que a ação de exterminar os primatas é não só um perigo ao equilíbrio ambiental das florestas, mas também inútil para o combate a Febre Amarela.
Assim, criamos a campanha com a mensagem de que os macacos não transmitem a febre amarela e que eles são tão vítimas quanto nós e nossas famílias. Para ilustrar a arte da campanha, utilizamos a fotografia dos bugios que disse acima. Até o momento em que escrevo este texto, a campanha teve uma ótima repercussão nas mídias sociais, atingindo mais de meio milhão de pessoas, com quase 10 mil compartilhamentos. Eu particularmente, considero que essa é uma foto que cumpriu o objetivo para o qual ela foi criada.
Já sentia, desde do momento do click do olho no olho com aquele Bugio, que a foto serviria para um propósito maior. Espero que com a campanha tenha, mesmo que um pouquinho, feito a diferença na vida de alguns bugios e evitando que pessoas façam mal a esses macacos que já estão sofrendo tanto com a febre amarela.
Eles não precisam de mais uma ameaça!